quarta-feira, 22 de abril de 2009

quarta-feira, 5 de setembro de 2007

Cortando o laço ou entrevista com Carlos Merigo

Depois dessa movimentação toda na blogosfera nas últimas semanas – monetização, credibilidade, BlogCamp e Estadão foram assuntos que renderam discussões acaloradas dentro e fora da rede – resolvi que tinha de me embrenhar mais nesse movimento para tentar entender melhor qual é o papel dele, a sua força e quem são as pessoas por trás de blogs famosos, anônimos, artísticos ou mesmo dos famigerados miguxos. E haveria melhor forma de fazer isso do que montando o meu próprio blog? Pois então, sejam bem vindos ao Desvenda Blogs.

Para quem não me conhece, prazer, meu nome é Rodrigo Martins. Sou jornalista e trabalho no caderno de tecnologia do Estadão, o Link. Mas o lance neste espaço não tem nada a ver com o Estadão, vou postar de forma pessoal e independente. O que busco aqui é reunir diferentes opiniões para uma mesma questão: “Quem é a blogosfera brasileira?” Por isso, uma idéia que me passou pela cabeça, e que me motivou a criar este blog, é entrevistar blogueiros de diferentes perfis e discutir com eles questões relacionadas a essa nova mídia, que, já ouvi algumas pessoas dizendo, está começando a ganhar força somente agora no País, embora haja blogs com quatro, cinco anos de idade.

Já estou com outras idéias para este blog, mas, em um primeiro momento, pretendo publicar uma entrevista por semana.... O que eu peço para quem descobrir e curtir este blog é que me mande sugestões de blogueiros para eu entrevistar. Já tenho alguns nomes em mente, mas, à medida que as entrevistas forem rolando e este blog for recebendo comentários, eu, de fato, quero “desvendar” um pouco da blogosfera e ter mais idéia das pessoas interessantes para conversar (elas não precisam ser famosas nem receber um milhão de visitas por dia, basta ter uma boa história....).

E o primeiro entrevistado, que inaugura este espaço, é o publicitário Carlos Merigo, de 26 anos, do blog Brainstorm#9. Conheci ele quando estava fazendo a cobertura do debate do Estadão, na quarta passada, e o convidei para a entrevista abaixo. Por ter sido o primeiro a divulgar a polêmica do Estadão na rede e por escrever em um dos blogs mais respeitados na área de publicidade, achei que seria bacana começar essa empreitada tendo ele como personagem.

A entrevista rolou por e-mail. Mandei para ele um questionário gigantesco – me empolguei totalmente nas perguntas quando fui escrever. O resultado foi uma entrevista bem bacana, onde ele comenta o barulho que seu post sobre o Estadão causou – “A repercussão foi muito maior do que imaginava”, diz -, aponta que há na blogosfera muita preocupação com a monetização, mas não com o conteúdo – “Isso (o conteúdo) é um problema. Atualmente tem muito blog e muita gente que começa um blog achando que vai ganhar rios de dinheiro” – e responde as críticas dos blogueiros por não ter “partido para o ataque” no debate do Estadão: “Se tivéssemos tido mais tempo, eu teria abordado diversos outros pontos, mas não mudaria minha postura”, afirma. “Ninguém foi lá para ser o mártir dos blogs, representar a opinião do todo. Fomos para dar o primeiro passo.”

Foto: arquivo perssoal

Quando decidiu criar o seu blog?
Minha vida online começou em meados de 1995, acessando as famosas BBSs. O primeiro site que fiz, e veja só, em Microsoft Word, foi em 1998. Era de humor, com textos meus e uma coletânea de piadas que rodavam a internet via e-mail. Para os padrões da época fez até um certo sucesso, mas o desativei em 2002, meses antes de começar o Brainstorm #9.

Na hora de decidir o tema, por que escolheu escrever sobre publicidade?
Foi uma união entre a vontade de escrever e de compartilhar informações com uma das minhas paixões, que é a publicidade. Na época, eu tinha acabado de entrar na faculdade, e queria que meu blog fosse focado. Não existia nenhum blog brasileiro ainda sobre o assunto.

Quando você começou a blogar, qual a imagem que você fazia dos blogs? Essa imagem mudou hoje?
Eu conheci blogs como praticamente todo mundo: “é um diário, só que na internet". Vi diversos blogs que eram mesmo diários virtuais, daqueles que só interessam para a própria pessoa que escreve e no máximo para seu círculo de amigos. Só que eu realmente abri os olhos para a ferramenta, que, na época, eram os Blogspots e Bloggers da vida, quando conheci excelentes blogs de pessoas que tinham algo a dizer e escreviam sobre coisas interessantes, como o extinto MotoContínuo do Daniel Sansão e o Pensar Enlouquece do Alexandre Inagaki. Acho que se houve uma mudança de imagem foi na importância e no poder que um blog pode ter. Quando comecei, mal poderia imaginar no que o Brainstorm #9 iria se tornar, na importância que ele teria (e tem) na minha vida pessoal e profissional. Para mim era um hobby, um espaço para eu falar o que quisesse, compartilhar informações com quem estivesse interessado e nada mais.

Se formos olhar os tais rankings, que geraram discussões entre os blogs semanas atrás, o Brainstorm #9 está sempre entre os primeiros. Como foi esse crescimento do seu blog? Houve alguma estratégia para aumentar a visitação?
Nenhuma estratégia especial. Só comprometimento com a periodicidade de posts e conteúdo, é claro. O aumento na visitação e na credibilidade foi conseqüência. O que fez a audiência do blog crescer, ao longo de cinco anos, foi sempre o boca-a-boca. Pessoas indicando umas para as outras.

Qual a média de visitação mensal do seu blog? De onde você pega esses números?
Eu uso Google Analytics e Clicky para monitorar o blog. Tenho em média 400-450 mil visitantes/mês. É claro que para um blog independente, amador, é um número que pode parecer alto, mas é pouco perto de outros grandes blogs.

O seu blog é bem segmentado e tem um público bem definido: os publicitários. Você acha que a saída para o sucesso dos blogs é essa, a segmentação?
Não sei se a segmentação é premissa para o sucesso. O Sedentário & Hiperativo, por exemplo, é um blog que fala dos mais diversos assuntos e tem uma audiência três vezes maior que o Brainstorm #9. Mas para mim a segmentação foi fator decisivo. Consegui atingir um público específico, que visita o meu blog em busca da minha opinião sobre o universo da comunicação. É por isso que mais do que audiência, a segmentação me ajudou a construir a minha reputação.

Como conversamos no debate do Estadão, você disse que consegue ganhar dinheiro com seu blog. Quanto, em média, você chega a ganhar por mês? Seria o suficiente para você largar o emprego?
É o suficiente para pagar meu apartamento e algumas despesas pessoais, mas ainda não para me dedicar só ao blog. Já pensei que algum dia talvez seja possível ser blogueiro em tempo integral, mas atualmente faria isso. Gosto do meu trabalho na agência (ele trabalha na Fischer América), estou me desenvolvendo profissionalmente. Enquanto der para conciliar as duas tarefas, o farei. Mas como disse, o mais importante disso tudo é a reputação construída. Através dele fiz vários contatos profissionais, inclusive meu trabalho nas últimas três agências que passei surgiu através do site. O blog me abriu muitas portas. Eu talvez saísse da faculdade sendo só mais um recém-formado na área de publicidade, tendo que bater na porta das agências para pedir uma oportunidade. O Brainstorm #9 acabou virando meu currículo, meu portfólio.


Não é o caso do seu blog, mas já vi outros que colocam trocentos links patrocinados na página (há o título do post, um monte de publicidade e depois o texto), além de muita publicidade nas laterais e no meio dos posts. Você acha que esse monte de anúncios não polui o site e afasta o leitor?
Realmente existem alguns exageros nesse sentido, mas é natural que anúncios acabem, de certo modo, poluindo o blog. Só que ao contrário do que conhecemos por publicidade, os anúncios em blogs podem ser considerados mais como um serviço oferecido ao leitor do que uma interrupção, um incômodo. Essa é a grande vantagem da publicidade contextual. O leitor só vai ver anúncio que tenha a ver com o conteúdo que ele está acessando. Isso é relevante pra ele e bom para o dono do blog, porque é mais eficiente e dá mais retorno. Algumas pessoas se sentem incomodadas ao saberem que o blog que elas lêem está ganhando dinheiro. Mas o cara que escreve no blog dedica tempo e, muitas vezes, também investe dinheiro naquilo para oferecer conteúdo gratuito. Nada mais justo do que o blogueiro tentar encontrar formas de obter retorno com seu trabalho. O que eu não acho válido é a tentativa de enganar o leitor, colocando anúncios de forma que pareçam parte do conteúdo do site. Isso é má fé, e inclusive está sendo combatido por vários programas de monetização, o próprio Google está advertindo quem faz uso essa prática.

Você já foi convidado para levar o seu blog para um portal?
Há uns dois anos recebi uma proposta de um grande portal. Minha audiência se ampliaria, a visibilidade seria maior e ainda teria o apoio comercial de um grande grupo. Acabei não aceitando porque não chegamos a um acordo quanto a hospedagem do blog. Eu não poderia arcar com os custos de servidor por ter milhões de acessos por dia. Resumindo: eles queriam meu conteúdo, mas eu teria mais custos do que ganhos.

Falamos acima de dinheiro, mas agora queria tocar no assunto conteúdo. No seu caso, há veículos mais tradicionais na área, como o Meio & Mensagem e o Blue Bus, por exemplo. No que você procura se diferenciar? Há um papel diferente que o seu blog exerce em relação a esses sites?
Acredito que os papéis sejam bem diferentes. Eu não tenho a pretensão de suprir a necessidade do leitor por um veículo tradicional. Seria leviandade minha pensar assim. O Meio & Mensagem é um grande veículo, uma empresa, com diversos profissionais que cobrem o universo da comunicação. Na verdade, eles têm obrigação de cobrir tudo o que diz respeito ao mundo de agências e isso é o que o leitor espera deles. Já eu não. Eu sou uma pessoa só, com um blog feito por mim mesmo. Só falo do que gosto, do que me interessa. As pessoas que acessam o Brainstorm #9 o fazem para saber a minha opinião. É isso que quero, que meu blog seja cada vez mais Carlos Merigo, pessoa física. Entende a diferença? Se eu quisesse competir com veículos tradicionais, abriria uma empresa e contrataria uma equipe. Não é o caso, não é o que pretendo.

Tentando ampliar um pouco essa discussão, qual é o papel dos blogs perante à mídia noticiosa mais tradicional, como jornais, revistas, TV e sites de notícia?
Não quero dizer que os blogs tenham que se manter à margem das coisas, virar algo como um gueto das mídias. Mas acredito que o papel dos blogs é a opinião à parte, é o lado mais pessoal, opinativo e especializado. Blogs comentam notícias e dão sua visão das coisas. Poucos blogs dão furos de reportagem, e essa não é a intenção de grande parte deles, mas atualmente muitos blogs estão pautando a mídia tradicional. Isso acontece porque tem muita gente de tudo quanto é canto do mundo postando, trazendo novidades. Nenhum jornal, veículo ou empresa teria estrutura e verba para fazer uma cobertura dessas. Sem contar que muitos blogs são especialistas em determinados assuntos, por isso passam a ser mais rápidos e ter mais propriedade naquilo que falam. No fim das contas, as coisas se complementam. Não acho que deva existir essa divisão: mídia tradicional x blogs. Os grandes veículos continuarão dominantes e relevantes, mas cada vez mais tendo que dividir espaço com o conteúdo gerado por pessoas comuns. O que deve existir é uma troca de informações, de links, de experiências.

O que te passou primeiro pela cabeça quando você viu a campanha do Estadão? Gostaria que você contasse a história de como a viu pela primeira vez e por que decidiu publicar o post. E como viu essa repercussão toda na blogosfera?
Um amigo na agência contou que tinha visto a campanha na TV. Imediatamente fui procurá-la, já imaginando que o material geraria polêmica. Quando vi, era pior do que imaginava. Uma tentativa infantil e tola de ridicularização dos blogs, porém, eficiente pela veiculação em massa que tem. A campanha, na minha visão, ajuda a fomentar ainda mais o estigma que os blogs já carregam. Para quem conhece e tem blogs não muda nada, mas reduz o horizonte de quem poderia ter contato com esse universo. Algumas pessoas disseram que me ofendi à toa, que vesti a carapuça, mas não acho que combater um conceito generalista e preconceituoso signifique “vestir a carapuça”. A repercussão foi muito maior do que imaginava. Desde o começo sabia que causaria polêmica, mas não tanto para gerar centenas de posts e as mais variadas reações.

Por que você acha que o Estadão realizou o debate na semana passada? Como você viu a iniciativa?
Algumas pessoas dizem que não passou de jogada de marketing, de tentativa do Estadão de aplacar os ânimos. Sinceramente, não acredito nessas teorias da conspiração. E que seja, o que importa é o que o espaço foi aberto e o debate foi válido. Foi uma saída inteligente do Estadão? Foi. Mas também foi o reconhecimento de que os blogs podem incomodar. E talvez o aprendizado mais importante para mim nesse dia, e isso nenhum dos críticos do debate tiveram a oportunidade, foi conhecer as pessoas por trás do jornal, do conteúdo do site. Perceber que entre os profissionais ali existem diversos blogueiros. Que escrevem, visitam e gostam de blogs e bom conteúdo. Pessoas que também não concordaram com a campanha.

Li os comentários nos blogs depois do debate. Vi que muitos criticaram, principalmente, você e a Bruna por não terem tido uma postura mais ofensiva. Qual era o seu objetivo quando foi ao debate? Como vê as críticas?
Conversando com a Bruna e o Edney no dia anterior ao debate, decidimos debater de forma mais ampla, e não alimentar picuinhas e discussões infrutíferas sobre a campanha. Também acompanhei as críticas (à nossa participação), mas continuo defendendo uma postura madura, conversa de igual para igual, com serenidade. É óbvio que eu gostaria e tinha muito mais para falar, mas a dinâmica de um debate procura dividir o pouco tempo igualmente para todos. Se tivéssemos tido mais tempo, eu teria abordado diversos outros pontos, mas não mudaria minha postura. Muitos blogueiros defenderam a guerra franca no debate, mas eu não acho que é assim que se conquista respeito. Ninguém foi lá para ser o mártir dos blogs, representar a opinião do todo. Fomos para dar o primeiro passo. De todo modo, o Estadão prometeu realizar mais debates, outros blogueiros terão a oportunidade de participar e aí veremos.

O que se discutiu muito no debate foi a credibilidade dos blogs. Você acha que esse é um problema hoje na blogosfera? Por que?
Esse é um problema da blogosfera e das mídias como um todo. A credibilidade sempre vai estar em cheque por causa muitos que afetam a imagem do todo. A generalização é um problema. O que sempre vai prevalecer é qualidade dos bons veículos, o bom conteúdo. Credibilidade se conquista assim, não afirmando que se tem.

Juntando a última pergunta com o que presenciei no BlogCamp, onde se discutiu muito a monetização dos blogs. Você acha que essa preocupação excessiva com a monetização é um problema para o conteúdo dos blogs, que poderia estar sendo colocado em segundo plano?
Isso é um problema, sim. Atualmente tem muito blog e muita gente que começa um blog achando que vai ganhar rios de dinheiro. Primeiro que a realidade não é essa, não é só criar um blog e consultar o saldo no dia seguinte. Segundo que essas pessoas não se preocupam com o conteúdo, em oferecer informação relevante para o leitor. Acho que faltou essa discussão tanto no BlogCamp como no debate.

No seu blog, quais os cuidados que você toma quando vai publicar alguma coisa? Você procura fazer jornalismo? Costuma entrevistar pessoas?
Tomo cuidado com as conseqüências que meu texto pode ter. O que estou escrevendo vai ser lido e é relevante para muitas pessoas. Faço uma boa pesquisa para checar informações, ver o que outras pessoas já falaram sobre o assunto. E tomo cuidado com o tom em que falo. Eu não quero virar um crítico de publicidade: o cara que fala demais, e não faz nada. Quero divulgar informações e emitir opiniões, o que gosto e o que não gosto. Não tenho a pretensão de ensinar ninguém. É tudo discussão, todos aprendendo e desvendando juntos.

Qual o ensinamento, se é que há, você acha que a blogosfera tirará das últimas movimentadas semanas? Como você acha que isso irá refletir na blogosfera daqui para frente?
Eu espero que o aprendizado seja dos blogs assumirem seu lugar, seu espaço. Não mais abaixar a cabeça e ficar a margem das coisas. Acredito que toda essa polêmica ajudou para abrir os olhos de muita gente quanto aos blogs, e dos próprios blogueiros pensarem que quem quer ser relevante nesse mercado precisa se levar a sério sim.

Tentando fazer um exercício de futurologia: como você vê o estágio da blogosfera brasileira há cinco anos, hoje e daqui a 5 anos? O que você acha que irá mudar?
Há cinco anos era um cisco, alguns poucos testando e tentando aqui e ali. Hoje ela já teve seu big bang, deu o primeiro passo para passar a influenciar e ser relevante. Hoje, a blogosfera brasileira já é vista com outros olhos pela mídia, pelo mercado, pela publicidade e pelos próprios leitores. Daqui a 5 anos espero que o estágio de maturidade seja ainda maior, e que os blogs passem cada vez mais a serem chamados para as conversas e valorizando seu conteúdo, acima de tudo, cada vez mais. Não gosto dessas comparações, mas para ser prático, espero chegarmos um dia no estágio da importância da blogosfera norte-americana, por exemplo.

No debate do Estadão, o Pedro Dória fez uma provocação interessante: quando os blogs ganharão relevância para causar repercussão? Você acha que não existe essa relevância? Por que? Você acha que a blogosfera irá ganhá-la? Como e falta muito?
Eu disso isso no meu blog pós-debate: a repercussão gerada, o debate e até essa entrevista são sinais de que a blogosfera brasileira é relevante, sim, que começa a conquistar seu espaço, sim. Senão, para que tanto barulho? Estamos vivenciando as mudanças diariamente e tão de perto, que às vezes não as percebemos. Mas quem, quando viu os blogs surgirem há cinco, sete anos atrás, poderia imaginar que hoje estaríamos debatendo dessa maneira? Alguns percebem mais rapidamente que outros, mas nem por isso as mudanças deixam de acontecer.